A noção de privilégio é por si só característica do sistema psico-sócio-econômico em que vivemos, que provavelmente nem consigamos mais chamar de capitalismo. Isso ocorre pelo fato de que a noção de privilégio é uma noção eminentemente comparativa, e a visão do privilégio parte necessariamente da visão concorrencial entre pessoas.
Vemos as demais pessoas como os outros e não como uma extensão de nós mesmos e, partindo dessa premissa, torna-se confortável estarmos numa situação de acesso a recursos e estruturas que o outro não tem, porque a desgraça do outro passa a ser simplesmente algo que não diz respeito a mim mesmo. Somos a sociedade da empatia moribunda, por vezes manifestada como um mecanismo de autopromoção.
Esse sistema de auto-adulação e pouca parcimônia em demonstrar desprezo pelos que nos cercam evolui constantemente e nos leva a uma constante sensação de náusea, advinda da nossa necessidade de permanecer relevante. O privilégio, no fim, é uma oscilação constante entre o desejo de ser esquecido enquanto você desfruta das benesses de um sistema injusto. É peremptório que busquemos formas de coalizão para além de nossas idiossincrasias para sobrevivermos num mundo hostil.