Depois de uma semana de buscas – sem muita dedicação do governo , o Brasil acordou com essa notícia no gélido 13 de junho

Apesar disso (e da informação ter sido dada por um órgão do governo brasileiro, a embaixada do Brasil no Reino Unido), a Polícia Federal (aparelhada pelo Bolsonaro desde 2019) insiste em dizer que não é verdade:

Independente dos desmentidos, uma coisa é fato: um dos maiores indigenistas do Brasil e um grandioso jornalista internacionalmente reconhecido certamente foram mortos em um contexto em que isso causa desgaste ao governo Bolsonaro. E por isso a informação segue truncada. Afinal, o Brasil de Bolsonaro é o Brasil em que literalmente nenhuma informação oficial é confiável porque absolutamente tudo vira alvo de uma maldita “guerra cultural”. Absolutamente tudo é feito sob o prisma “no que isso pode ajudar ou prejudicar o líder supremo?”
É de chorar de raiva, eu sei. Mas é também para termos algo maior que raiva: vergonha. Esqueçam o nacionalismo. Esqueçam o orgulho verde e amarelo. Que nosso orgulho seja sempre incrédulo, que a resposta à pergunta “você é de qual país?” sempre venha com a voz baixa e desviando o olhar.
O nacionalismo costuma produzir coisas horríveis. No Brasil, os dois governos que mais usaram o nacionalismo como arma política também foram os dois que mais cometeram atrocidades: o governo da ditadura militar (especialmente com Médici) e o governo Bolsonaro. No Brasil, o nacionalismo promoveu o orgulho da abominação, da destruição, da “marcha para o oeste” que destrói a floresta e os povos originários.
Existem outros países que de alguma forma ressignificaram seus nacionalismos, como Alemanha e Japão. Esses países foram subjugados e tiveram suas atrocidades expostas. Com essas atrocidades expostas, a ressignificação nacional veio de outras maneiras. O primeiro e mais importante passo foi a autolimitação militar. Quer dizer, não foi exatamente uma “autolimitação”, mas, a medida em que as forças de ocupação foram diminuindo seu papel, esses países perceberam que a autolimitação era positiva. A Alemanha se tornou o país da indústria eficiente. O Japão, o país da tecnologia e da pujança econômica. Em ambos os casos, o orgulho nacional passou a ser mais vinculado à reconstrução do que a guerra.
Hoje, é como se o Brasil estivesse na guerra, cometendo as mais terríveis atrocidades em nome de um orgulho nacional estúpido, artificial, com aroma de putrefação. É preciso que nossas atrocidades como país sejam expostas uma a uma, e que a vergonha nos una, para que possamos de fato nos autolimitar, para que possamos punir como criminosos de estado (especialmente os militares), e para que possamos trocar quietos nosso processo de reconstrução, com vergonha, sem medo de pedir ajuda para terceiros.
Mas tem um fator no Brasil que é diferente da Alemanha, do Japão, ou mesmo da Rússia expansionista atual: o impulso de destruição dos aparatos de violência brasileiros é contra o brasileiro. Por isso, a necessidade de autocontenção é ainda mais urgente. A autocontenção no Brasil deve ser draconiana e abrangente: das Forças Armadas às polícias estaduais, todos devem ser contidos. O Brasil está em uma guerra civil declarada há décadas, em que uma parte da população (essencialmente preta e pobre) é dizimada para atender os interesses econômicos de uma galera e o desejo quase erótico de alguns homens de pinto murcho por um estado policial. O que vai conter essa galera? A vergonha. A exposição das atrocidades e a punição sistemática delas. Mas para isso o orgulho da atrocidade em nome do “Brasil acima de tudo” precisa ser combatido como um combate existencial mesmo.
Trabalhar a contenção é a única esperança para que, daqui uns cinquenta anos, nossos netos possam ter algum orgulho de um Brasil novo, ressignificado, que ainda não conhecemos. E mesmo assim um orgulho amargo, de fundo melancólico, porque já matamos gente demais em nome do “orgulho brasileiro”.