Sabe qual é o grande problema da esquerda no Brasil, que vai além até das posições ideológicas? Falta de capilaridade.
Quando fomos procurar partidos pra apoiar a candidatura do Bruno Daniel em 2020, ficamos surpresos em saber que PCB e UP não tinham diretório em Santo André.
Estamos falando de Santo André, a 25a maior cidade do Brasil, e os dois partidos nem tinham como lançar candidatos porque não tinham um diretório constituído.
O Psol mesmo, que é muito maior, tinha diretório em só 109 dos 645 municípios paulistas em 2020. É ridiculamente pouco.
Os únicos partidos de esquerda que tem mais capilaridade nesse sentido são PT e PSB. Nem o PC do B tem muita capilaridade, por mais que seja antigo. Daí, nas cidades pequenas e médias, o debate político fica restrito às pautas de direita e centro direita.
Até porque o PT perdeu poder de fogo em muitas dessas cidades (exceto no Nordeste), e o PSB se notabiliza por ter abrigado quadros conservadores em cidades menores, que muitas vezes flertavam com o bolsonarismo. Por mais que eles estejam tentando mudar o perfil, não é algo fácil.
Com isso, a esquerda fica praticamente alijada da discussão política nesses locais. E ela é cada vez mais dominada por atores bolsonaristas, como os do agronegócio, por exemplo, afinal grande parte desses municípios têm forte dependência econômica em relação ao agronegócio.
Pequenos produtores sofrem com a falta de referências, bem como os trabalhadores locais. Movimentos como o dos Sem Terra são criminalizados sem muita capacidade de criarem um contraponto. E a maioria da esquerda urbana ignora esses movimentos porque não pensa além da sua cidade. Mas a esquerda precisa aprender a pensar o país de maneira integrada.
É por isso que movimentos como o do Lula em viajar pelo país são importantes. Porque a mera passagem dele pode ajudar a organizar pessoas que se identificam com a esquerda em escala local, não é difícil abrir um diretório municipal, bastam 150 assinaturas pra comissão provisória.
Mas se a esquerda quer mesmo ter alguma relevância no debate político, se quer eleger mais do que 150 deputados, ir para o interior é essencial, capilarizar os movimentos é urgente, a integração com produtores e trabalhadores além dos grandes centros é imperativa.
Se isso não for feito, cenários bizarros como o da existência de partidos que não tem diretório organizado na 25a maior cidade do país tendem a se repetir.
E eu entendo quem não acredita na política institucional. Eu mesmo reconheço as enormes limitações dela. Mas não existe vácuo de poder: se você não quer participar da política, alguém provavelmente menos qualificado vai tomar esse espaço.
Se os espaços institucionais não são ocupados pela esquerda, as discussões e pautas políticas tendem a ir cada vez mais para a direita. Foi o que aconteceu entre 2016 e 2018, em grande medida. E hoje temos mais gente de extrema direita do que de esquerda na Câmara.
Por isso, é hora de capilarizar os partidos de esquerda, de chamar mais gente pra discussão, formar uma força-tarefa nos partidos para isso, criar manuais de como montar seu diretório municipal de forma fácil.
É preciso facilitar a organização espontânea dos movimentos. Se não a energia transformadora deles se perde e não se torna algo com implicações práticas.
E seguem persistente a falta de aproveitamentos dos potenciais, sejam do “teu” mencionado ABCD (SP) ou da “minha” Baixada Fluminense; entre outros grupos de cidades médias (e mais tristemente para os interiores “quase inacessíveis”)…
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