Jair Bolsonaro nunca foi conhecido por ser um sujeito pacificador, mas a baixa na popularidade, as ações do Judiciário e as pressões trazidas pelas evidências da CPI estão levando a capacidade do presidente em criar conflitos a cada atitude a um novo patamar. Só nessa semana ele conseguiu criar confronto com:
– A Câmara dos Deputados, e, por consequência, o centrão, após vetar o fundo eleitoral de R$ 5,7 bilhões para 2022. A atitude é vista como uma traição, uma vez que os próprios bolsonaristas da Câmara votaram a favor do Fundão. E mais do que isso: vai forçar os deputados a sofrerem um desgaste desnecessário derrubando o veto de Bolsonaro. O Presidente “jogou para a torcida” e colocou os deputados na linha de fogo da opinião pública. Especialmente Arthur Lira e o centrão, que tem sido apoiadores fiéis na Câmara, a vista de muito repasse de recursos.
– O Senado, especialmente Rodrigo Pacheco, ao entregar um pedido de impeachment do Ministro do STF Alexandre de Morais assinado pelo advogado geral da União. Na última semana, os bolsonaristas já estavam chamando Rodrigo Pacheco de covarde. Esse pedido só aumenta a pressão sobre Pacheco e os Senadores. Ter o bolsonarismo fustigando os senadores nas redes sociais e inventando fake news para inflar a manifestação antidemocrática de 7 de setembro certamente não é a melhor forma de conseguir simpatia de quem quer que seja.

– O STF, onde Bolsonaro já não tem interlocução nenhuma depois dos ataques sistemáticos dos últimos meses. Dois pontos foram essenciais nesse desgaste: a insanidade do Presidente da República em insistir na retórica do voto impresso, questionando o TSE em sua integridade; e a miríade de processos que se avolumaram no STF contra o Presidente da República e seus aliados, muito por conta de ataques aos próprios Ministros do STF. Cometer a insanidade de propor o impeachment de Alexandre de Morais ao Senado é só o ponto mais alto desse conflito aberto.
– Por incrível que pareça, Bolsonaro também conseguiu dar sinais péssimos para o Procurador Geral da República Augusto Aras. O conflito aberto de Bolsonaro com o Senado tem sido comprometedor para as duas indicações de Bolsonaro que passarão pelo crivo do Senado nos próximos dias: a de André Mendonça para o STF e a de Augusto Aras para mais dois anos na PGR. Enquanto André Mendonça parece cada dia mais distante do STF com sua fidelidade canina a Bolsonaro, Augusto Aras resolveu agir de forma diferente, estabelecendo pontes com os senadores (especialmente Davi Alcolumbre) e com o STF. Com isso, já ganhou alguns pontos: sua sabatina para a recondução ao cargo de PGR foi marcada para a terça-feira, 24 de agosto, e Alexandre de Morais, sorteado para um processo que investigaria Aras por inação, disse que não pretende investigar o procurador.
Ao aumentar a temperatura do conflito com o Senado, Bolsonaro também acaba se afastando de Augusto Aras, ao menos temporariamente. Aras quer ser reconduzido à PGR por mais dois anos. Prova desse afastamento é que a subprocuradora Lindora Araújo foi quem autorizou as operações da PF contra Sérgio Reis e os demais nomes que insuflaram golpe contra o STF em áudios, convocando para manifestações em Brasília no dia 07 de setembro. Sim, a mesma subprocuradora disse ontem que Bolsonaro não precisa andar de máscara. E não, as coisas não precisam fazer sentido. Esse é o governo dos sinais contraditórios. Mas o conjunto dos sinais vai na mesma direção: a de que Bolsonaro é tóxico e todos precisam se afastar dele se quiserem garantir sua sobrevivência política ou profissional.
– Para a população: mais de 40% dos brasileiros em insegurança alimentar, inflação concentrada em alimentos, energia elétrica e combustíveis e absolutamente nenhuma vontade de resolver o problema estão levando Bolsonaro a índices de rejeição que ele nunca teve antes: de acordo com o PoderData, 64% dos brasileiros reprovam o trabalho do presidente.

– Finalmente, Bolsonaro suscita cada vez mais desconfiança dos mercados com suas atitudes impulsivas e com sua política econômica sem direção. Agentes do mercado consideram o impeachment cada vez mais provável. Tudo o que investidores precisam é de previsibilidade, é a escalada autoritária de Bolsonaro torna o cenário cada vez mais nebuloso. Além disso, a política econômica federal simplesmente deu errado: a inflação está nas alturas e as previsões para 2022 são cada vez piores. Vetar o fundão, tentar o impeachment de Alexandre de Moraes e atacar sistematicamente as instituições faz com que as atitudes de Bolsonaro sejam cada vez menos aceitáveis para o povo da Faria Lima.
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Ninguém sabe se Bolsonaro vai de fato continuar se enfraquecendo, se vai cair ou se por algum milagre vai se fortalecer a partir de agora. Mas o fato é que Bolsonaro coleciona inimigos em todos os lugares e não dá nenhum sinal de que vai parar de fazer isso. Agora é torcer para que ele caia o mais rápido possível, é que seus impulsos autoritários virem só piadas de mau gosto, porque o Brasil não suporta mais um ano nesse ritmo.