Por que intimidar jornalistas é errado?

As eleições acirraram os ânimos de muita gente, e infelizmente algumas delas esqueceram o que significa “limite”. No Brasil, nunca foram documentadas tantas ameaças e agressões durante um processo eleitoral, incluindo casos de estupro e assassinato.

Isso não significa, em hipótese nenhuma, que após a eleição o clima de ânimos acirrados se acalmou. Uma mostra disso foi a manifestação, em diversas cidades do país, que se alternava entre pedidos de “impeachment da Dilma” e “golpe militar”. Ambos os pedidos tentando rifar o valor mais importante do país: a democracia (inclusive, se quiserem saber mais sobre o QUÃO RUIM foi a ditadura, leiam aqui)

O fato é que pessoas antidemocráticas não admitem que são antidemocráticas, porque a democracia é um valor incontestável na maioria das sociedades ocidentais e não pode ser contestada com argumentos racionais. Como não existem argumentos racionais para esses grupos antidemocráticos contestarem a democracia, criam-se factóides, como a “ameaça de golpe comunista bolivariano”, por exemplo. Amigos, nenhum país “comunista bolivariano” tem banco privado lucrando R$ 5,4 bilhões em um trimestre. Não existe qualquer indicativo de “limitação de compras” por parte dos cidadãos, como se faz na Venezuela, por exemplo. Pelo contrário: os estabelecimentos gourmet eclodem como nunca e podem ser considerados símbolos do nosso capitalismo, que é baseado sobretudo na identificação com as classes mais altas. Em suma: qualquer ameaça de “golpe comunista” que vem sendo falada por aí não é nada além de falácia.

Mas, apesar de tudo isso, tem gente que aposta na falácia, e que faz isso única e exclusivamente por ódio. Vamos recordar mais uma vez como funcionam os discursos de ódio e por que eles não devem ser tolerados (sim, vou repetir até todo mundo decorar):

“NENHUM discurso de ódio deve ser tolerado. Sob justificativa nenhuma. E, para isso, é bom recorrer à história dos genocídios. Do nazismo à Ruanda, passando pela Bósnia e pela Armênia, a maioria deles, durante a história da humanidade, teve três etapas:

– A naturalização do ódio contra uma minoria ou contra um “povo rival”, sob os argumentos mais esdrúxulos
– A disseminação desse ódio por toda a população pelos mais diferentes meios, geralmente relacionados com o poder
– A “colocação em prática” desse ódio, agredindo a minoria ou o “povo rival” em questão”

Vejam bem: o ódio enquanto arma implica necessariamente um ataque a alguém mais fraco ou sem condições de se defender com a mesma intensidade.

E é isso que essa extrema-direita maluca do Brasil está fazendo, em suas diversas vozes. A coincidência no discurso do Lobão, do Roger do Ultraje, do Danilo Gentili, do Reinaldo Azevedo, do Olavo de Carvalho e do Rodrigo Constantino está aí. São todos eles discursos que promovem o ódio (às vezes travestido de “humor”) e que incitam ataques coletivos a pessoas que não podem se defender com a mesma intensidade, de alunos de faculdade a senhoras que amamentam.

E ontem essa perseguição chegou a dois jornalistas, da Folha e do Estadão.

O site Reaçonaria (sic) publicou um texto acusando os repórteres Gustavo Uribe, da Folha de São Paulo, e Ricardo Chapola, do Estado de São Paulo, de “serem petistas”, ao ridicularizarem uma manifestação que podia a volta da ditadura militar. Indicaram, no texto, diversos “indícios”, como se “ser petista” fosse um crime. Passaram os dados dos repórteres, para que os “fãs” do site pudessem perseguí-los. Tudo isso em um texto apócrifo, apesar de existirem vários colunistas no site. E, obviamente, os jornalistas passaram a ser ameaçados, a ponto da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) soltar uma nota condenando essas ameaças.

Pra começar: o que é esse tal de “Reaçonaria”? É um site que se propõe conservador, que propõe construir uma discussão política baseada no viés da direita. Isso seria ótimo, a princípio, porque o Brasil carece de quadros de direita. Depois da redemocratização, a direita se sentiu “envergonhada” no país, por ser frequentemente associada à ditadura. Até partidos com viés neoliberal, como o PSDB, se descrevem até hoje como “centro esquerda”. Ter uma “direita” declarada discutindo política melhoraria muito o nível das discussões, se a coisa fosse feita da forma apropriada.

Mas não é o que acontece com esse site. O “reaçonaria” está registrado como “reaçonaria.org”, nos EUA, via GoDaddy, em regime de “registration private” (os dados estão aqui). Isso quer dizer duas coisas:

1) O site foi registrado por uma pessoa jurídica, como todo registro “.org”
2) O site foi registrado de forma anônima deliberadamente.

Além disso, o “reaçonaria” tem largo histórico de intimidação aos outros. Dedicam, inclusive, uma coluna inteira para isso, postando para ridicularização coletiva conteúdos “de esquerda” sem preservar a identidade dos envolvidos. É humor? Não, é opressão, porque a maioria das pessoas que aparece ali não tem condições de se defender das ofensas em redes sociais de uma horda ensandecida de comentaristas de portal. É disseminar o ódio contra quem não tem condições de se defender, sob a proteção do anonimato (que, lembrem, é proibido pela Constituição Federal)

No caso dos jornalistas citados, isso ganha contornos mais graves. Porque é cercear o exercício da profissão do jornalismo. Em um país que aparece em 111º lugar no ranking mundial de liberdade de imprensa, é algo temerário. Vamos às considerações:

– É uma atitude covarde, porque tenta acertar o elo mais fraco da cadeia de produção de notícias (o repórter). Guardadas as devidas proporções, é como se a presidenta Dilma, quando criticou a revista Veja pela capa pré-eleição, não criticasse a revista, mas o repórter que assinou a matéria. Repórteres são apenas funcionários que respondem a editores, e o que sai no jornal ou na revista sai com anuência desses caras. Deflagrar perseguições contra a imprensa é errado. Deflagrar perseguições contra o elo mais fraco da imprensa não é só errado: é covarde.

– O argumento “ah, mas o PT também divulgou lista de jornalistas inimigos na véspera da eleição” é inválido. Por um motivo ridiculamente simples: um erro não justifica o outro. Pedir a cabeça de jornalistas é sempre errado. O que o jornalista divulga como notícia deve cair sempre na conta do órgão de imprensa que o contrata, e não do jornalista como pessoa física. O jornalista não escreve aquilo porque quer, mas porque alguém o contratou para escrever aquilo e revisou o texto antes de colocá-lo no ar.

– As posições políticas pessoais dos jornalistas não devem servir de parâmetro para nada. Muito menos para sua atuação profissional. Por mais que isso se confunda nessa era de redes sociais, é necessário o mínimo de coerência, ainda mais se o site reúne número razoável de fãs que repercutem esse discurso, como é o caso do reaçonaria (e é o caso também dos colunistas da Veja, do Lobão, do Danilo Gentili, do Olavo de Carvelho e de afins).

– Pra finalizar: se um site incentiva a perseguição a jornalistas porque eles adotaram um tom crítico em relação a um protesto cheio de placas e faixas sugerindo “intervenção militar”, o pressuposto óbvio é o de que esse site, direta ou indiretamente, apóia a idéia de “Intervenção militar”, e, portanto, está na lista dos grupos anti-democráticos de extrema-direita que usam factóides para tentar relativizar a democracia, que, repito, é o valor mais fundamental da política na maioria das economias de mercado.

Em resumo, quase desenhando:

– Perseguir jornalistas é errado.
– Perseguir jornalistas individualmente é mais errado ainda.
– Perseguir jornalistas individualmente por reportagens veiculadas em um jornal ou revista é ainda pior.
– Incitar os outros a perseguir jornalistas individualmente por reportagens veiculadas em um jornal ou revista é nojento.
– Incitar os outros a perseguir jornalistas individualmente por reportagens veiculadas em um jornal ou revista sob a proteção do anonimato é absolutamente inaceitável.

Foi isso que a “reaçonaria” fez, e vem fazendo sistematicamente. E é esse tipo de atitude que deve ser sempre repudiado, venha da onde vier. Se esse tipo de atitude vier do PT, também deve ser repudiada. Não importa a origem: jogar uma horda ensandecida contra uma minoria que não pode se defender sempre será errado.

E, finalmente, há de se dizer o óbvio: tentar prejudicar os outros dessa maneira, com exposição ao linchamento virtual, é antes de tudo um tremendo mau caratismo. Não tem nada a ver com esquerda e direita: é apenas uma atitude babaca, de quem não tem limites e não sabe respeitar a liberdade alheia. Ou que quer ter algum tipo de favorecimento tentando tirar essa liberdade das outras pessoas, APENAS pelo motivo de que elas pensam diferente.

Não é à toa que para essas pessoas a democracia é um valor cada vez mais relativo.

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Um comentário sobre “Por que intimidar jornalistas é errado?

  1. Isso tudo o que vc descreveu acima nada mais é do que um Estado fascista sendo gestado e querendo se auto parir mas para que essa prole maldita viva é necessário que seja alimentada pela ignorância do populacho. Sejamos coerentes: a classe média Brasileira que agora tem seguidos ataques de pelancas e que elegeu o PT como o inventor da corrupção nacional é tão histrionicamente burra, inculta e brega que chega a beirar o patético. Não adianta ter diploma de curso superior porque isto só atesta que freqüentou um curso profissionalizante de nível superior e, mesmo assim, com a enxurrada de universidades do tipo “pagou-levou” nem para isto servem os tais certificados dada a pobreza dos currículos e da qualidade do ensino(?) ali ministrado. Humanidades, Filosofia, Artes, Política, matérias fundamentais ao desenvolvimento do caráter e da psyché são considerados supérfluos quando não ridicularizados por pseudo educadores trogloditas que só vêem no mercado profissional a razão da existência das escolas. Se vivêssemos num país agrícola sequer o Mobral tolerariam pois para manejar uma enxada e um trator não há necessidade de saber escrever seu nome, segundo eles. Nossa classe média é bufa, truculenta, clientelista, complexada e preguiçosa pois ao invés de se superar para melhorar seus rankings prefere deixar os outros na miséria para que não lhe façam competição. É esta gentalha bruta, selvagem e consumidora de drogas, brega nos modos, bestial na falta de educação e absolutamente sem noção quando o assunto é cultura que sai às ruas nestas manifestações fascistas porque é ali que eles podem extravasar seu preconceito e por alguns momentos voltarem a se sentir superiores numa falsa ilusão de que por alguma razão são diferenciados do restante dos cidadãos do país. É este lixo que é amealhado nas lojas maçônicas que estão a serviço do anglo sionismo, o qual manobra nas sombras para destruir as conquistas da última década, ávido para deitar as garras no pré-sal, nos bancos estatais, na poupança da classe média estúpida, no dinheiro dos programas assistenciais e de desenvolvimento e, se possível, levar o país a ficar novamente de joelhos perante o FMI e a corja sionista dos banqueiros internacionais. São estes bandidos os verdadeiros patrões de Aécio Neves et caterva e Marina Silva et choldra.
    Reacionaria é só um trocadilho entre Reação e Maçonaria, este câncer que deve ser extirpado de nossa sociedade nem que para isto tenha que se fazer uma caça às bruxas porque a coisa está se encaminhando para o seguinte panorama na visão deles: ou eu ou vc, mas os dois não vão conseguir mais fazer de conta que convivem pacificamente. E este velho blablablá de golpe militar não será o mamão com açúcar que foi em 64 porque hoje em dia o que mais tem é gente com treinamento militar e comprar armas com alto poder letal é bastante fácil – o narcotráfico que o diga. Então, que os fascistas pensem bem e se recolham à sua insignificância e aceitem as regras do jogo e a pressão popular porque senão no mano a mano eles levarão a pior, pode crer.

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