Eu tenho um problema com Silas Malafaia.
O problema não é que ele seja homofóbico. Embora eu discorde completamente da homofobia dele, é prudente admitir que ele não é o único homofóbico que existe por aí. É só mais um deles. É lamentável que esses caras existam e que convençam tanta gente, mas quando combatemos posturas preconceituosas precisamos fazer isso o tempo todo, tentando ser didático e apontando calmamente as incoerências dessas posturas em todas as pessoas. Se pegarmos Malafaia (ou Feliciano) como Judas, individualizando a culpa, ele terá todas as armas para fortalecer o discurso “nós contra eles” e afastar ainda mais o seu círculo de influência do restante da sociedade, montando um exército fundamentalista repleto de discursos prontos.
O problema dele não é que ele apoie ou cornete candidatos em campanhas eleitorais. Eu também faço isso. Se ele quiser apoiar a Marina Silva como cidadão, o problema é dele. Se os chiliques dele fazem ela divulgar “erratas” em seu plano de governo, o problema é dela. Se ele faz acusações cotidianas ao PT como cidadão, é normal, costumeiro, coisa que você vê gente influente fazendo todos os dias no Facebook ou no Twitter.
O meu problema com Silas Malafaia começa no título dele, de Pastor. Porque ele aparece na mídia como Pastor, tem programa de TV como Pastor, é homofóbico como Pastor, apóia e corneta candidatos como Pastor. E a Bíblia, que é a única fonte de referência para ele, diz algumas coisas a respeito disso:
Finalmente, irmãos, tudo o que for verdadeiro, tudo o que for nobre, tudo o que for correto, tudo o que for puro, tudo o que for amável, tudo o que for de boa fama, se houver algo de excelente ou digno de louvor, pensem nessas coisas.
Filipenses 4:8
Ok, cristãos precisam ser exemplos no procedimento. Como cristão, eu me questiono se chiliques em nome da discriminação de qualquer pessoa que seja são uma atitude cristã. Porque discriminação é uma espécie de favoritismo às avessas. E está bem clara a posição de Deus em relação a isso:
Meus irmãos, como crentes em nosso glorioso Senhor Jesus Cristo, não façam diferença entre as pessoas, tratando-as com favoritismo
Tiago 2:1
Além disso, incomoda muito que, como cristão, ele queira tanto interferir na política. Porque esse não foi o discurso de Jesus Cristo. A mistura entre religião e política era a característica de uma aliança antiga, entre Jeová e o povo judeu, e essa aliança foi substituída por outra, inteiramente baseada na figura de Jesus Cristo. Está na Bíblia também:
Cristo é o mediador de uma nova aliança para que os que são chamados recebam a promessa da herança eterna, visto que ele morreu como resgate pelas transgressões cometidas sob a primeira aliança.
Hebreus 9:15
Mais do que isso: Cristo, ainda em vida, promoveu a separação entre igreja e Estado. Ele sempre deixou claro que não queria ser um Messias político, como muitos em Israel acharam que ele fosse (Judas Iscariotes, inclusive), mas um Deus encarnado que morreria em sacrifício pelos pecados de todos, dando a chance de remissão para qualquer um que reconhecesse a validade de seu sacrifício. Por isso Ele separou igreja e Estado muito claramente. Tá na Bíblia também:
Dize-nos, pois: Qual é a tua opinião? É certo pagar imposto a César ou não? “
Mas Jesus, percebendo a má intenção deles, perguntou: “Hipócritas! Por que vocês estão me pondo à prova?
Mostrem-me a moeda usada para pagar o imposto”. Eles lhe mostraram um denário,
e ele lhes perguntou: “De quem é esta imagem e esta inscrição? “
“De César”, responderam eles. E ele lhes disse: “Então, dêem a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”.
Mateus 22:17-21
Ao separar claramente as obrigações em relação ao César, o imperador romano, das obrigações para com Deus, Jesus Cristo estabeleceu um princípio que muitos líderes evangélicos teimam em ignorar: a separação entre Igreja e Estado. É uma das grandes novidades do Novo Testamento, tendo em vista que no Antigo Testamento o dinheiro do Estado judeu foi utilizado até mesmo para construir o Templo original de Salomão – e depois para reconstruí-lo, com Neemias.
Mas, além de tudo isso, algo me incomoda ainda mais em Silas Malafaia. E isso é um incômodo maior do que todos os outros. Malafaia, a cada vez que aparece em alguma reportagem, mostrando influência, se coloca como porta-voz dos evangélicos. E esse é o grande problema.
Eu sou evangélico. A cada vez que pessoas como Malafaia, Marco Feliciano, Ana Paula Valadão ou qualquer outra saem falando “em nome dos evangélicos”, é como se essas pessoas me incluíssem na opinião delas. É como se eu referendasse um discurso tacanho, sectário, mesquinho, e que, na minha interpretação, vai contra os princípios bíblicos e contra o cristianismo que eu sempre pratiquei.
É esse o meu grande problema. Eu não posso deixar o discurso de Silas Malafaia me representar. Eu tenho a obrigação de repudiar um discurso que tenta generalizar a todos os evangélicos como um povo que odeia outros grupos sociais. E isso não por alguma filosofia de vida, mas porque está escrito na Bíblia:
Quem odeia seu irmão é assassino, e vocês sabem que nenhum assassino tem vida eterna em si mesmo.
1 João 3:15
Não quero sobre mim a pecha de assassino. Mais do que isso: não quero odiar ninguém, e também não aceito que um bando de pastores preconceituosos que deturpam o que está escrito na Bíblia para obter benefícios pessoais e políticos represente os evangélicos como um todo.
Não aceito que esse grupo de pastores misture religião e política a ponto de montar uma “Frente Parlamentar Evangélica”. Eu não aceito o marketing de que “o Brasil será do Senhor” e que isso envolve a incorporação das estruturas políticas existentes por grupos evangélicos com ideias próprias, que dizem representar o cristianismo no Brasil como um todo.
Eu nem mesmo aceito a teologia da maioria desses pastores, a tal “teologia da prosperidade”, que se baseia na prosperidade terrena e não na promessa de uma vida eterna “apesar das aflições desse mundo” (Lucas 8:39).
Não suporto mais os problemas que pastores levianos como Silas Malafaia e Marco Feliciano tem causado para quem tenta ser cristão de verdade e encontra diariamente dois tipos de preconceitos: dentro das igrejas, por não tolerar esse discurso pernicioso de ódio, e fora delas, por ser enquadrado pela sociedade como “mais um porta voz” desse maldito discurso de ódio que definitivamente não é meu.
Dito isto, só tenho uma coisa a dizer para os amigos gays, para os amigos de outras religiões e para os amigos que são alvo todos os dias de discursos de ódio como o do Pastor Malafaia. Tá na Bíblia, mas leiam em primeira pessoa, como se eu tivesse dizendo isso para vocês:
Nisto conhecemos o que é o amor: Jesus Cristo deu a sua vida por nós, e devemos dar a nossa vida por nossos irmãos. Se alguém tiver recursos materiais e, vendo seu irmão em necessidade, não se compadecer dele, como pode permanecer nele o amor de Deus? Filhinhos, não amemos de palavra nem de boca, mas em ação e em verdade.
1 João 3:16-18
Nós amamos vocês, amigos. Existem pessoas que realmente amam vocês. Não tomem o discurso de ódio de caras como o Malafaia como o discurso geral.
E você, Malafaia, pare de tentar falar por mim. Meu conceito de Evangelho está muito distante de suas posições discriminatórias e de seu discurso de ódio.
Texto perfeito! Parabéns!
Ps: Não sabia que você era evangélico.
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Onde é que eu assino?
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Eu discordo muito do seu ponto de vista, pois não vejo incoerência na manifesto do silas malafaia contra leis que nos proibiriam de pregar contra a pratica homossexual, e que se talvez não fosse ele avisar talvez hoje no brasil estaríamos vivendo uma sociedade onde haveria uma sociedade eleita acima dos outros “onde o maior serviria ao menor”.
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Elton, a questão é: por que a orientação sexual é tão importante para pessoas como você e Malafaia?
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P. S. Você leu o post inteiro? Incluindo as citações da Bíblia?
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Elton, não é privilégio se os homossexuais passam a ter direitos que os héteros já tinham. É Igualdade.
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Pessoas como eles nos deixam com vergonha de falarmos que somos “evangélicos”. As pessoas de fora infelizmente não percebem a diferença e logo nos relacionam a eles como se fôssemos todos farinha do mesmo saco. Passei dois anos falando do amor de Deus pra um amigo gay, e após a *brilhante* entrevista do sr queridíssimo Malafaia na Marilia Gabriela, esse meu amigo praticamente fechou todas as portas pra ouvir. Quem não ama seu irmão se torna assassino porque faz com que ele deixe de receber a palavra de Deus, que é a vida!
Não sei nem mais o que dizer! o texto é perfeito! Obrigada por conseguir expressar tudo que eu sempre desejei!
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Amen!
Preach!
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Este é um evangélico que verdadeiramente conhece a Palavra de Deus!
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teu discurso é de tamanha sobriedade e educação, também clarividência na Bíblia, concordo firmemente contigo.
Quantos evangélicos verdadeiros e amorosos, (porque os verdadeiros são realmente cheios de amor) estão sendo discriminados, por aqueles que são discriminados, estão sendo odiados por aqueles que são odiados, e ficam numa situação delicada. Parabéns pela sua posição.
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