Hoje, foram divulgados os dados da inédita pesquisa ONU-Habitat para as cidades latino-americanas, em que o Brasil aparece como a quarta nação mais desigual da América Latina. O relatório completo pode ser baixado nesse link.
Apesar da grande evolução (o Brasil era o país mais desigual da região em 1990), os dados comprovam que ainda somos um país de desigualdades, em uma região de desigualdades. Os dados dizem algumas coisas:
A América Latina é a região mais urbanizada do mundo
É impossível não associar a urbanização na América Latina à história da região. E é uma prova definitiva de que desenvolvimento não resulta necessariamente em urbanização.
A América Latina conta com uma taxa de urbanização muito maiores que os demais países do mundo com IDH similar. Isso é culpa, em grande parte, da cultura histórica da plantation na região, especializada na monocultura em grandes propriedades. Não é à toa que a América Latina também apresenta alguns dos maiores índices de desigualdade social do mundo: ela foi promovida desde a colonização, com o agravante de se consolidar desde aquela época no uso do solo.
A América Latina é a região com as cidades mais violentas do mundo
Das 50 cidades mais violentas do mundo, 40 ficam na América Latina. Isso tem alguns motivos:
– As pessoas são expulsas do campo, que privilegia, na maioria das áreas, o latifúndio, cada vez mais mecanizado. A necessidade de mão de obra no campo diminui cada vez mais.
– A intensificação do uso de máquinas no campo contribui para a aceleração da migração para as grandes cidades, onde supostamente existe emprego e melhores condições de vida. No entanto, a cidade não foi projetada para abrigar essa migração rápida.
– No entorno das grandes cidades, forma-se uma área de segregação, sem acesso aos serviços públicos. Uma cidade segregada e sem oportunidades. Um enorme contingente de pessoas fica “espremido” nesses locais. No Brasil, o índice de indigência, de acordo com o relatório da ONU, está em 22% da população, atualmente. Em 1990 era de 41%.
– Essa situação de “limbo”, de rejeição no campo e na cidade, contribui para muitos agirem à margem da lei. Não é o único motivo, obviamente. Mas essas regiões tornam-se especialmente suscetíveis à violência, como se estivesse ocorrendo, no limite, uma luta pela sobrevivência nesses locais.
– E, finalmente, no caos também são criadas organizações. O México tem o narcotráfico mais poderoso do mundo (também por fornecer drogas para o maior mercado consumidor do mundo, o dos EUA), até algum tempo atrás era a Colômbia. O Brasil é um dos principais entrepostos para a exportação de drogas para Europa, e também tem organizações criminosas fortes nas grandes cidades.
– Com isso, a violência urbana explode, demandando investimentos em segurança e provocando uma sensação de medo generalizado. Que só será superada quando esse processo de exclusão social descrito se romper.
A região sofre com o caos nos transportes e no saneamento básico
Pela expansão urbana rápida e caótica, não foi criada uma estrutura adequada de vias urbanas e de saneamento básico. O resultado disso é a poluição urbana, com resultados mensuráveis na quantidade de esgoto despejada em rios como o Tietê, por exemplo, e o aumento exponencial dos congestionamentos. Em São Paulo, por exemplo, o gasto dos governos com o transporte público é ampliado em cerca de 15% única e exclusivamente pelos transtornos causados por congestionamentos.
Há esperança para a região
Apesar de todo o cenário negativo, existe esperança de um futuro melhor para as cidades latino-americanas. O processo de migração para as cidades já está praticamente concluído, e o objetivo dos governos, a partir de agora, é construir a estrutura necessária para dar qualidade de vida para todo esse contingente populacional instalado, ainda que de forma precária, nas cidades. As políticas de inclusão social tem sido determinantes para a melhoria das condições de vida nas periferias das grandes metrópoles.
A pobreza ainda é terrível na região, e é fruto de um processo histórico. No entanto, a situação latino-americana está muito melhor do que há 20 anos. Ainda que continuem havendo percalços, talvez, em mais vinte ou trinta anos, a região diminua as suas desigualdades a níveis aceitáveis, incluindo a população indigente e conseguindo alternativas sustentáveis para o desenvolvimento.